quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Inferno

Ela olha para ele deslumbrada. Os olhos brilham, os dedos enrolam o cabelo.
Quase consigo ler-lhe o pensamento.
Ela acha que ganhou o bilhete premiado da lotaria; ele é interessante, educado, conversador.
Ela não vê o gelo, vê o brilho; como o do sol quando se reflecte na neve.
Ela não vê a montanha, nem o perigo das curvas ou a instabilidade, ela só vê que ele é encantador.
Ela não percebe como é que um homem daqueles está sozinho. Acha-o maravilhoso, divertido, boa companhia.
Ela não sabe que ele é como uma droga, viciante e gratuita no inicio; muito cara depois do vício.
O que ela não sabe também, é que o bilhete, é só de ida: para o Inferno. 

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Depois de ti...

Há pessoas que nos ficam para sempre na memória. Pessoas que nos marcam pelas melhores ou piores razões. Tu conseguiste marcar-me por ambas. Foste o meu namorado iô-iô. Ora estavas, ora não estavas, não sei quantas vezes começámos e acabámos, a dada altura desisti de contar. Foste a primeira pessoa que me disse que eu tinha mau feitio. Mau feitio, eu? Olha para ti. Um leão e um carneiro a medirem forças. Cada um mais teimoso que o outro. Nenhum disposto a ceder. Claro que não podia correr bem.

Tu conseguias transformar o melhor, numa tortura. “Eu não gosto de ti”. Silêncio absoluto, eu a morrer, já com falta de ar e tu continuavas – “ Eu amo-te”. Tu a dizeres: ”Espectacular…” na primeira vez que me despiste. Eu envergonhada. E logo a seguir “ Mas tens de ter cuidado para não ficares com celulite no rabo”. Ora isso foi uma excelente recomendação, mas era por coisas como essa que às vezes só me apetecia bater-te! Ou tu a dizeres que me tinhas visto no Arraial  Académico com o meu namorado e que tinhas apanhado uma piela monstruosa nessa noite e eu sem perceber se por minha causa, ou apenas por que sim.

 Às vezes não sabia o que te havia de fazer… Era o teu olhar que me despia à descarada, eu a sentir que a minha roupa era transparente, a cara a ficar vermelha de embaraço. Ou a dizeres a um amigo teu: “É ela.” E os teus olhos brilhavam. Ou no meio duma multidão de gente num sítio qualquer à noite, tudo escuro, luzes a piscar, eu a passar por ti sem te ver e tu a segurares-me o pulso, a puxares-me para ti e a perguntares ao meu ouvido :  “Onde é que pensas que vais?”, “Para longe.” - pensava eu - "Para longe...". E os meus joelhos a ficarem como gelatina e eu já não ia a lado nenhum, a não ser para onde tu quisesses que eu fosse.

Partiste o meu coração no dia em que te confessaste apaixonado por outra mulher. Pela forma como falaste dela percebi que te tinha perdido para sempre. E na eventualidade de algo te correr mal, mudei de número de telefone, com a consciência de que se me quisesses procurar, terias de te esforçar muito. Ou não, porque sempre tivemos tendência para nos encontrarmos sem querer, sem saber. Parecia que o Universo tinha um plano para nós e se esforçava por nos juntar, não sei com que objectivo. Nunca percebi.

 Tu obrigaste-me a crescer, da pior maneira possível. Eu podia ter crescido à mesma, mas não daquela maneira. Um dia disseste-me que eu não lutava por ti. Não podia, não tinha força, estava a lutar por mim própria. Disseste-me também que se um dia fossemos amigos era porque nunca tínhamos sido outra coisa, isto enquanto o teu olhar subia pelo meu corpo, medindo cada milímetro da minha pele. E eu, engolia em seco.

 Para te esquecer fiz de conta que tinhas morrido. Proibi toda a gente de dizer o teu nome. Fiz luto. Fiquei pálida porque só saia à noite. “A lua não bronzeia “ - dizia o meu irmão do meio. Um dia pegou em mim e levou-me um fim-de-semana para o Alentejo.”Vais apanhar sol”. Acho que ele se apercebeu que eu estava a definhar. Tu eras o meu oxigénio. Trabalhei 16 horas por dia, meses a fio. Saia quase todas as noites para um sítio qualquer, ia a casa dormir e trocar de roupa. A trabalheira que me deu esquecer-te… E agora, tantos anos depois, voltas e queres ser meu amigo. E a minha melhor amiga vai dar o teu nome ao filho dela. “Eu sei” dizia-me ela, a tentar consolar-me ainda antes de eu conseguir falar. “Desculpa, mas é o nome que o pai quer…”. É mas é o Universo a rir-se de mim.

Não sei em que prateleira te vou colocar… Sei que acabou, mas começo a achar que não és um homem, és um karma. Devia ter aproveitado a visita do Papa para um exorcismo. Dizem que trazemos para a nossa vida as pessoas de que precisamos e não consigo perceber qual é o teu papel. O que é que tens ainda para me ensinar? Ou serei eu a ti? Se o que não nos mata nos torna mais fortes, tu tornaste-me quase imortal, uma verdadeira fortaleza de força. Depois de ti, percebi que tudo o que passasse por mim seriam grãos de areia. Depois de ti Pedro, tudo seria tão mais fácil de ultrapassar. Obrigada.

 (Outubro/Novembro 2009)

A folha

Insignificante
Folha
Levada
P'lo Vento
Num Turbilhão
Flutua
Cai
Suavemente
E recomeça
Tudo

De Novo.

CMar - algures no tempo.